Este Trabalho de Projecto sobre os Processos Atípicos de Desenvolvimento surge no âmbito da Disciplina de Psicologia A do 12º ano.
Para aprofundarmos os nossos conhecimentos realizamos uma visita ao CADIN (Centro de Apoio ao Desenvolvimento Infantil) onde entrevistamos a psicologa Sandra Pinho.
Gostaríamos de saber quais são os comportamentos atípicos do desenvolvimento com os quais o CADIN lida diariamente?
Diariamente,
lidamos, muito com perturbações no espectro do autismo, que vão desde o autismo
mais grave/severo até ao autismo ligeiro, na forma da síndrome de asperger.
Trabalhamos também com deficiência mental. Seguimos muitas pessoas com
hiperatividade, défice de atenção e outros problemas de comportamento
associados, com problemas de dislexia e várias dificuldades de aprendizagem
específica, são realmente estes 4 grupos: autismo, deficiência mental,
hiperatividade e dificuldades de aprendizagem específica que caraterizam,
maioritariamente, aqueles que nos procuram.
Qual é o género e a média de idades que predomina no CADIN?
No caso
do autismo e da hiperatividade os estudos de prevalência indicam uma
prevalência maior no sexo masculino, por exemplo, no caso da síndrome de
asperger estima-se uma razão de 5/6 rapazes para cada rapariga. Cada vez mais,
temos vindo a questionar esses resultados, nós supomos que existem tantas
raparigas com síndrome de asperger ou até com défice de atenção como rapazes,
mas nós supomos que as manifestações nas raparigas são diferentes, são mais
subtis e por isso muitas vezes passam desapercebidas. Falando no caso da
hiperatividade, por exemplo, o que nos parece acontecer é que é que a
hiperatividade e o défice de atenção têm dois grandes tipos: o tipo
predominantemente hiperativos e o tipo predominantemente desatentos. Aliás, há
um terceiro que é um misto destes os dois tipos. Eventualmente nos rapazes o
tipo predominante é o tipo hiperativo e como as manifestações são mais visíveis,
eles chegam mais facilmente às consultas. Nas raparigas o tipo predominante é o
tipo desatento, tem características de sonhadora, cabeça na lua, não chateia
ninguém e portanto não chega às consultas. De facto acabam por ser mais rapazes
do que raparigas inscritos aqui por estas razões, não por haver mais
prevalência mas sim pelas manifestações, logo chegam mais facilmente. Em termos
de idades como lhe disse e como viram num dos slides, acompanhamos aquelas
percentagens.
Qual é a reação da família ao saber que têm um familiar com problemas de ordem emocional e psíquica?
Aqui nós
avaliamos sobretudo os problemas de desenvolvimento, ou seja, o problema
emocional, por exemplo se chegar aqui uma criança com um problema de ansiedade,
que às vezes chegam, a reação é sempre de preocupação, mas sabemos que é um
problema com resolução e que poderá ter uma remissão completa. Quando falamos
de perturbações do desenvolvimento, são crónicas, são irreversíveis, sobretudo,
se falarmos em deficiência mental e em autismo, sabemos que é tratável mas não
é curável. Um diagnóstico de autismo positivo é devastador para os pais, porque
sabem que é para o resto da vida e que vai haver uma dependência para o resto
da vida. O diagnóstico da hiperatividade, défice de atenção ou dificuldades
específicas de aprendizagem é menos chocante, embora realmente, regra geral com
grande preocupação e com vontade de se mobilizarem para ajudar e mobilizar
todos os recursos necessários. Ou seja, vemos muitas vezes famílias, apesar das
dificuldades económicas, apesar das dificuldades em termos de tempo,
mobilizarem-se muito para virem aqui e para virem às terapias. Os pais às vezes
têm de esperar 2/3 horas na sala de espera, enquanto a criança, está a ter
terapia e portanto preocupação e mobilização para ajudar é a reação que vemos
mais frequentemente. Ma também há casos em que os pais não aceitem o
diagnóstico. E nestes caso, já aconteceu, as pessoas não aceitarem, saírem
daqui e nem quererem levar o relatório, como se estivesse contaminado, indo procurar
outra equipa. Isto mostra que, muitas vezes, é um processo que a família tem
mesmo que viver, ou seja, ter um filho com deficiência mental, por exemplo,
exige um luto por parte dos pais e do filho semelhantes. Este luto tem fases
que têm de ser ultrapassadas, a primeira que é de negação, uma segunda de
raiva, “porque é que isto me aconteceu a mim?”, uma terceira de tristeza e uma
quarta de aceitação e não adianta tentar acelerar este processo. E quando
acontece ver uma família em perfeita negação, ou até já em raiva, até pode
virar-se contra nós técnicos, a minha atitude tem de ser de empatia,
compreensão, aceitação, porque é um processo que a família tem de viver para
chegar à aceitação.
A síndrome de asperger pode ser considerada um espectro do autismo?
Não pode
ser considerada, ela é mesmo, é um autismo ligeiro, nós fazemos estes
diagnósticos por referência a um manual, que se chama manual diagnóstico e
estatístico das perturbações mentais, que é DSM, e que é revisto com alguma
regularidade. Neste momento estamos numa versão 4 revista, DSM 4R, mas está
mesmo a sair a DSM 5R, a designação de síndrome de asperger vai desaparecer,
diz o manual, e vai ficar ao abrigo de outra designação que é perturbações do
espectro do autismo, que são depois divididas em 3 níveis, nível 1, 2 ou 3, de
acordo com o nível de funcionalidade, ou seja, aquilo que se chamava síndrome
de asperger vai passar a ser chamado perturbações do espectro do autismo, nível
1, que é o nível de funcionalidade maior.
Com que idade normalmente as crianças dão entrada aqui no CADIN?
É muito
diferente, o autismo é detectado muito mais cedo. No autismo a criança tem
comportamentos muito desviantes. Às vezes há muitas mães que notam desde da
nascença, sobretudo se forem mães que já tinham outros filhos, no momento em
que lhes pegam ao colo notam a diferença, porque não olham para a mãe, porque
não se aninham no colo da mãe e muito depressa começam a notar, embora levem o
seu tempo a aceitar a situação e a agir. Temos diagnósticos muito precoces
normalmente os mais precoces desde dos 2 anos até aos 4 anos e são autismos
severos. A síndrome de Asperger geralmente já aparecem cá mais tarde, por serem
manifestações mais ligeiras, diria 8/9 anos. Já fiz diagnósticos de síndrome de
Asperger aos 30 anos, a partir dos 20. É variável.
Qual é o perfil dominante nas crianças com autismo?
Fala-se
numa tríade de dificuldades no autismo, dificuldades na interpretação do real,
dificuldades da comunicação e um conjunto de precaridades no comportamento e no
pensamento destas crianças que inclui, por exemplo, uma grande rigidez quer em
termos de pensamento quer em termos de comportamento, que faz com que eles
precisem de ter comportamentos muito repetitivos e com que precisem de rotinas
e muita estrutura para realmente conseguirem estar na escola ou em qualquer
ambiente, têm muitas vezes hipersensibilidade sensoriais o que quer dizer que,
por exemplo, o barulho que hoje este projecto está a fazer é perturbante para
eles ou se eu acendesse estas luzes podia ser perturbante também, certos sons
como sirenes, som de um aspirador, de um secador pode pô-los realmente muito
ansiosos. Hipersensibilidades também em texturas, ao ponto de não suportarem o
contacto com determinados tecidos, com a areia na praia, com determinados
materiais que são usados na escola. Hipersensibilidades também ao nível
gustativas e portanto rejeitarem determinados alimentos. Hipersensibilidades ao
nível do olfacto portanto serem muito mais sensíveis a determinados cheiros. No
caso do autismo profundo esta tria de dificuldades, na comunicação, na
interação social e precaridades de pensamentos são acompanhadas de uma
deficiência mental, ou seja, têm dificuldades generalizadas de aprendizagem,
precisam desde cedo de ter apoios educativos específicos. No caso do Síndrome
de Asperger a tríade de dificuldades está lá o que não está são as dificuldades
generalizadas de aprendizagem, ou seja, as pessoas com Asperger têm uma
inteligência média ou superior à média. Há um mito que todas as pessoas com
Asperger têm uma inteligência superior, podem ter uma inteligência média ou
superior à média.
Quais as causas que têm mais influência? Genéticas ou meio?
Tem sido
muito muito investigado e de facto cada vez mais se acredita numa base genética
do autismo, parece é ser uma base genética multideterminada e que eventualmente
depois pode ter algum tipo de interação ou fatores perinatais, é por isso que é
tão difícil descobrir. Temos milhares de genes, porções de genes para estudar e
parece haver, de facto, uma interação genética com fatores do meio durante a
gravidez ou durante o parto, mas há fortes indicadores que nos inclinam para a
origem genética, porque temos aqui imensos casos de irmãos onde em 4 irmãos, 2
têm autismo. Temos vários casos de gémeos verdadeiros em que ambos têm autismo.
Eu presenciei um caso de gémeos verdadeiros em que ambos têm autismo e depois
tenho um outro em que é gémeo falso e só ele é que tem autismo. Logo há uma
maior incidência nos gémeos verdadeiros do que falsos e também uma maior incidência
de gémeos do que outro tipo de irmãos. Há um forte indicador que seja uma
predisposição genética. O pai já era esquisito, o tio já era esquisito
geralmente alguém vem muitas vezes com a criança para fazer diagnóstico e nós
pensamos vou dizer ao pai ou não vou dizer e nós pensamos, ele não perguntou
nada mas claramente vemos que tem qualquer coisa. Mas ainda não se descobriu
que gene específico, tem sido feita muita investigação, envolve muito tempo e
muito dinheiro e já houve muito tempo em que se tiveram teorias completamente
postas de parte, nomeadamente a famosa teoria da mãe frigorífico, e estas
crianças ficaram assim porque a mãe lhes era indiferente às suas necessidades,
não era afetiva, isto foi completamente posto de parte. Uma outra que tinha a
ver com a vacina da vaps porque coincide a idade em que esta é administrada,
com a idade em que crianças com autismo têm regressões e portanto as pessoas
associavam, mas também está posta de parte.
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