sexta-feira, 17 de maio de 2013

Entrevista ao CADIN - 1ª Parte

Este Trabalho de Projecto sobre os Processos Atípicos de Desenvolvimento surge no âmbito da Disciplina de Psicologia A do 12º ano.
Para aprofundarmos os nossos conhecimentos realizamos uma visita ao CADIN (Centro de Apoio ao Desenvolvimento Infantil) onde entrevistamos a psicologa Sandra Pinho.


Gostaríamos de saber quais são os comportamentos atípicos do desenvolvimento com os quais o CADIN lida diariamente?


Diariamente, lidamos, muito com perturbações no espectro do autismo, que vão desde o autismo mais grave/severo até ao autismo ligeiro, na forma da síndrome de asperger. Trabalhamos também com deficiência mental. Seguimos muitas pessoas com hiperatividade, défice de atenção e outros problemas de comportamento associados, com problemas de dislexia e várias dificuldades de aprendizagem específica, são realmente estes 4 grupos: autismo, deficiência mental, hiperatividade e dificuldades de aprendizagem específica que caraterizam, maioritariamente, aqueles que nos procuram.

Qual é o género e a média de idades que predomina no CADIN?


No caso do autismo e da hiperatividade os estudos de prevalência indicam uma prevalência maior no sexo masculino, por exemplo, no caso da síndrome de asperger estima-se uma razão de 5/6 rapazes para cada rapariga. Cada vez mais, temos vindo a questionar esses resultados, nós supomos que existem tantas raparigas com síndrome de asperger ou até com défice de atenção como rapazes, mas nós supomos que as manifestações nas raparigas são diferentes, são mais subtis e por isso muitas vezes passam desapercebidas. Falando no caso da hiperatividade, por exemplo, o que nos parece acontecer é que é que a hiperatividade e o défice de atenção têm dois grandes tipos: o tipo predominantemente hiperativos e o tipo predominantemente desatentos. Aliás, há um terceiro que é um misto destes os dois tipos. Eventualmente nos rapazes o tipo predominante é o tipo hiperativo e como as manifestações são mais visíveis, eles chegam mais facilmente às consultas. Nas raparigas o tipo predominante é o tipo desatento, tem características de sonhadora, cabeça na lua, não chateia ninguém e portanto não chega às consultas. De facto acabam por ser mais rapazes do que raparigas inscritos aqui por estas razões, não por haver mais prevalência mas sim pelas manifestações, logo chegam mais facilmente. Em termos de idades como lhe disse e como viram num dos slides, acompanhamos aquelas percentagens.

Qual é a reação da família ao saber que têm um familiar com problemas de ordem emocional e psíquica?


Aqui nós avaliamos sobretudo os problemas de desenvolvimento, ou seja, o problema emocional, por exemplo se chegar aqui uma criança com um problema de ansiedade, que às vezes chegam, a reação é sempre de preocupação, mas sabemos que é um problema com resolução e que poderá ter uma remissão completa. Quando falamos de perturbações do desenvolvimento, são crónicas, são irreversíveis, sobretudo, se falarmos em deficiência mental e em autismo, sabemos que é tratável mas não é curável. Um diagnóstico de autismo positivo é devastador para os pais, porque sabem que é para o resto da vida e que vai haver uma dependência para o resto da vida. O diagnóstico da hiperatividade, défice de atenção ou dificuldades específicas de aprendizagem é menos chocante, embora realmente, regra geral com grande preocupação e com vontade de se mobilizarem para ajudar e mobilizar todos os recursos necessários. Ou seja, vemos muitas vezes famílias, apesar das dificuldades económicas, apesar das dificuldades em termos de tempo, mobilizarem-se muito para virem aqui e para virem às terapias. Os pais às vezes têm de esperar 2/3 horas na sala de espera, enquanto a criança, está a ter terapia e portanto preocupação e mobilização para ajudar é a reação que vemos mais frequentemente. Ma também há casos em que os pais não aceitem o diagnóstico. E nestes caso, já aconteceu, as pessoas não aceitarem, saírem daqui e nem quererem levar o relatório, como se estivesse contaminado, indo procurar outra equipa. Isto mostra que, muitas vezes, é um processo que a família tem mesmo que viver, ou seja, ter um filho com deficiência mental, por exemplo, exige um luto por parte dos pais e do filho semelhantes. Este luto tem fases que têm de ser ultrapassadas, a primeira que é de negação, uma segunda de raiva, “porque é que isto me aconteceu a mim?”, uma terceira de tristeza e uma quarta de aceitação e não adianta tentar acelerar este processo. E quando acontece ver uma família em perfeita negação, ou até já em raiva, até pode virar-se contra nós técnicos, a minha atitude tem de ser de empatia, compreensão, aceitação, porque é um processo que a família tem de viver para chegar à aceitação.

A síndrome de asperger pode ser considerada um espectro do autismo?


Não pode ser considerada, ela é mesmo, é um autismo ligeiro, nós fazemos estes diagnósticos por referência a um manual, que se chama manual diagnóstico e estatístico das perturbações mentais, que é DSM, e que é revisto com alguma regularidade. Neste momento estamos numa versão 4 revista, DSM 4R, mas está mesmo a sair a DSM 5R, a designação de síndrome de asperger vai desaparecer, diz o manual, e vai ficar ao abrigo de outra designação que é perturbações do espectro do autismo, que são depois divididas em 3 níveis, nível 1, 2 ou 3, de acordo com o nível de funcionalidade, ou seja, aquilo que se chamava síndrome de asperger vai passar a ser chamado perturbações do espectro do autismo, nível 1, que é o nível de funcionalidade maior.

Com que idade normalmente as crianças dão entrada aqui no CADIN?


É muito diferente, o autismo é detectado muito mais cedo. No autismo a criança tem comportamentos muito desviantes. Às vezes há muitas mães que notam desde da nascença, sobretudo se forem mães que já tinham outros filhos, no momento em que lhes pegam ao colo notam a diferença, porque não olham para a mãe, porque não se aninham no colo da mãe e muito depressa começam a notar, embora levem o seu tempo a aceitar a situação e a agir. Temos diagnósticos muito precoces normalmente os mais precoces desde dos 2 anos até aos 4 anos e são autismos severos. A síndrome de Asperger geralmente já aparecem cá mais tarde, por serem manifestações mais ligeiras, diria 8/9 anos. Já fiz diagnósticos de síndrome de Asperger aos 30 anos, a partir dos 20. É variável.

Qual é o perfil dominante nas crianças com autismo?


Fala-se numa tríade de dificuldades no autismo, dificuldades na interpretação do real, dificuldades da comunicação e um conjunto de precaridades no comportamento e no pensamento destas crianças que inclui, por exemplo, uma grande rigidez quer em termos de pensamento quer em termos de comportamento, que faz com que eles precisem de ter comportamentos muito repetitivos e com que precisem de rotinas e muita estrutura para realmente conseguirem estar na escola ou em qualquer ambiente, têm muitas vezes hipersensibilidade sensoriais o que quer dizer que, por exemplo, o barulho que hoje este projecto está a fazer é perturbante para eles ou se eu acendesse estas luzes podia ser perturbante também, certos sons como sirenes, som de um aspirador, de um secador pode pô-los realmente muito ansiosos. Hipersensibilidades também em texturas, ao ponto de não suportarem o contacto com determinados tecidos, com a areia na praia, com determinados materiais que são usados na escola. Hipersensibilidades também ao nível gustativas e portanto rejeitarem determinados alimentos. Hipersensibilidades ao nível do olfacto portanto serem muito mais sensíveis a determinados cheiros. No caso do autismo profundo esta tria de dificuldades, na comunicação, na interação social e precaridades de pensamentos são acompanhadas de uma deficiência mental, ou seja, têm dificuldades generalizadas de aprendizagem, precisam desde cedo de ter apoios educativos específicos. No caso do Síndrome de Asperger a tríade de dificuldades está lá o que não está são as dificuldades generalizadas de aprendizagem, ou seja, as pessoas com Asperger têm uma inteligência média ou superior à média. Há um mito que todas as pessoas com Asperger têm uma inteligência superior, podem ter uma inteligência média ou superior à média.

Quais as causas que têm mais influência? Genéticas ou meio?


Tem sido muito muito investigado e de facto cada vez mais se acredita numa base genética do autismo, parece é ser uma base genética multideterminada e que eventualmente depois pode ter algum tipo de interação ou fatores perinatais, é por isso que é tão difícil descobrir. Temos milhares de genes, porções de genes para estudar e parece haver, de facto, uma interação genética com fatores do meio durante a gravidez ou durante o parto, mas há fortes indicadores que nos inclinam para a origem genética, porque temos aqui imensos casos de irmãos onde em 4 irmãos, 2 têm autismo. Temos vários casos de gémeos verdadeiros em que ambos têm autismo. Eu presenciei um caso de gémeos verdadeiros em que ambos têm autismo e depois tenho um outro em que é gémeo falso e só ele é que tem autismo. Logo há uma maior incidência nos gémeos verdadeiros do que falsos e também uma maior incidência de gémeos do que outro tipo de irmãos. Há um forte indicador que seja uma predisposição genética. O pai já era esquisito, o tio já era esquisito geralmente alguém vem muitas vezes com a criança para fazer diagnóstico e nós pensamos vou dizer ao pai ou não vou dizer e nós pensamos, ele não perguntou nada mas claramente vemos que tem qualquer coisa. Mas ainda não se descobriu que gene específico, tem sido feita muita investigação, envolve muito tempo e muito dinheiro e já houve muito tempo em que se tiveram teorias completamente postas de parte, nomeadamente a famosa teoria da mãe frigorífico, e estas crianças ficaram assim porque a mãe lhes era indiferente às suas necessidades, não era afetiva, isto foi completamente posto de parte. Uma outra que tinha a ver com a vacina da vaps porque coincide a idade em que esta é administrada, com a idade em que crianças com autismo têm regressões e portanto as pessoas associavam, mas também está posta de parte.

Sem comentários:

Enviar um comentário